Opinião: “atacar a Rádio Cidade é atacar a sociedade”
Por Júnior Alves*
Tentar invadir o estúdio da Rádio Cidade foi, certamente, um dos atos mais antidemocráticos de toda a história de Tabira.
O século XIX foi marcado no Brasil pelo tempo do coronelismo. Durante a República Velha os coronéis eram latifundiários que exerciam o domínio político no interior do Brasil e coagiam para se manter a todo custo no poder.
O voto de cabresto foi o símbolo do coronelismo. Naquela época, quando se falava em coronelismo, não era uma referência aos coronéis do Exército Brasileiro, mas sim aos chefes locais que massacravam os trabalhadores.
A República Velha e o coronelismo ficaram para trás, mas nos dias atuais, em pleno século XXI, essa manifestação coronelista ainda se faz presente através dos atuais coronéis de calça curta da política brasileira.
Esses coronéis de calça curta da nossa política atual acreditam que tudo pode, que são acima da lei e imunes aos rigores dela. Acreditam, erroneamente, que podem e devem massacrar o povo, invadir as casas, os veículos de imprensa, ameaçar as pessoas e fazer outras atrocidades mais que só existem no imaginário da cabeça vazia deles.
É preciso que hoje se restabeleça uma verdade: a imprensa é livre. Infelizmente no Brasil, sobretudo nesses últimos anos, criou-se uma cultura equivocada de tentativa de cecear a liberdade de imprensa e temos observado um grave processo de achincalhe, ataques e agressões de toda ordem.
Os coronéis de calça curta da política brasileira querem a todo custo dificultar o fluxo das informações e o processo de conscientização das pessoas, o que prejudica a consolidação da cidadania e faz uma verdadeira afronta à Constituição Brasileira.
É um direito inviolável do cidadão tomar conhecimento dos desmandos da política e dos políticos, das proezas do crime organizado, do caldeirão da corrupção, das rachadinhas, das fraudes contra o consumidor, das explorações de pessoas ainda escravizadas, das maracutaias que acontecem na calada da noite, do posto de Saúde que não tem médico, da folha de pagamento vendida em silêncio, da promessa de campanha que foi cumprida, do menino que ainda não nasceu no hospital, do exame que ainda se espera dois anos para fazer e ninguém diz nada, etc.
Levar esses e outros tantos fatos à luz da ciência do povo é muito duro para os coronéis de calça curta da política brasileira, mas doa a quem doer, o povo tem o direito de saber e só consegue ter acesso a todas essas informações porque existe a liberdade de imprensa.
Nessa quarta-feira (17), a liberdade de imprensa foi atacada quando a Rádio Cidade FM de Tabira foi vítima de uma tentativa de invasão do seu estúdio por um representante desses coronéis de calça curta da política brasileira.
Tentar invadir o estúdio da Rádio Cidade foi, certamente, um dos atos mais antidemocráticos de toda a história de Tabira. Esse fato lamentável se deu justamente no momento em que a cidade está prestes a completar 74 anos de emancipação política.
Vejam o tamanho da contradição que hora nos deparamos. A palavra “emancipar” significa libertar-se. Mas como podemos nesse momento celebrar a liberdade se o coronelismo do século XIX está tão presente em nossos dias?
A tentativa de invasão ao estúdio da Rádio Cidade foi também uma tentativa de agressão ao nosso povo. Não me refiro a uma meia dúzia de gente privilegiada pelo sistema que nesse momento é beneficiado por um emprego temporário e, por essa razão, ver na Rádio Cidade uma potencial inimiga. Apesar de que, para chegarem aonde estão, a Rádio Cidade foi amiga.
Eu me refiro ao povo humilde, aos que não tem voz, aos que não tem vez, aos que não tem força para falar, aos descamisados, aos oprimidos, aos humilhados, aos esquecidos, aos perseguidos, aos pais e mães de crianças especiais, aos que tem fome, aos que tem sede de alimento e de justiça, aos que não tem rumo, aos que não tem saúde, aos que não tem seus direitos respeitados, aos agredidos, aos que não tem teto, aos que não tem família, aos que choram, aos que sentem dores, seja ela qual for.
Todos esses se sentiram atacados quando a Rádio Cidade foi atacada. Porque para todos eles a Rádio Cidade foi, ao longo desses anos todos, a voz que fala e defende, a mão que puxa do abismo e leva à luta, o abraço que afaga e protege.
Para todas as pessoas pobres de dinheiro e de consciência, de Tabira e dessa região toda, a Rádio Cidade foi, ao longo desses anos, e continuará sendo, o fogo que aquece o frio, a voz que clama por justiça e dignidade, a água no momento de sede, o refúgio na hora do desespero, o amparo na hora da queda.
É por essa razão que o povo também foi atacado quando a Rádio Cidade foi atacada. Se a Rádio Cidade sofreu uma tentativa de invasão, a intimidade deste povo também foi invadida. Se a Rádio Cidade sangra, esse povo também sangra e a democracia chora.
A democracia e a liberdade de imprensa são patrimônios da nação brasileira e não é qualquer coronel de calça curta, com a mente do século XIX, do tempo do coronelismo, que vai calar a nossa voz ou intimidar o nosso trabalho.
Democracia é respeitar uma visão, que seja ela a favor ou contra. É dar direito a falar. É oportunizar o contraditório. E isso a Rádio Cidade vem fazendo com exímia maestria.
Pra finalizar esse editorial queremos aqui agradecer a todas as manifestações de apoio que a Rádio Cidade e o radialista Fabrício Ferreira receberam dos ouvintes de Tabira e de todas as cidades onde o nosso sinal chega, o apoio das autoridades, das entidades, da Asserpe que representa o rádio e a televisão em Pernambuco, do sindicato dos radialistas, dos radialistas e jornalistas do Pajeú e do todo o estado, dos blogs e seus representantes e das emissoras de rádio.
Vamos seguir firmes e cada vez mais fortes e destemidos porque uma imprensa calada é um povo sem voz.
Júnior Alves é radialista da Cidade FM, tendo passagem por outras emissoras. Também atua como policial militar no estado da Bahia.