Orquestra Criança Cidadã encanta o Sertão
Por Magno Martins
Há 16 anos, no chuvoso julho de 2006, o maestro potiguar Cussy de Almeida, que Deus chamou em 2010, se deparou com um pequeno grupo de crianças pobres da periferia do Recife tocando flauta e outros instrumentos clássicos. Ficou encantado com o talento deles e deu um instalo: estimular entre eles a formação de uma orquestra.
Deu aulas, comprou parte dos instrumentos, arranjou um lugar para treinamento e estudos. Com o tempo, os garotos do Coque, um dos mais pobres e violentos da cidade, estreavam em apresentação para um grande público a agora famosa Orquestra Criança Cidadã do Recife. Logo em seguida, a Associação Beneficente Criança Cidadã, presidida pelo desembargador Nildo Nery dos Santos, tendo como idealizador e coordenador geral o juiz João José Rocha Targino, assumiu o projeto.
Com um grande objetivo: reinserir socialmente crianças e adolescentes por meio da música, com vistas à profissionalização, Cussy de Almeida assumiu a função de maestro com um ar de felicidade nunca estampado no rosto em toda a sua vida.
Criou uma escola de música com um corpo docente formado por 13 músicos de reconhecida competência, 2 luthiers, tendo um deles estudado na Itália, e um corpo funcional adequado às necessidades dos alunos. Com o tempo, o Exército Nacional foi um dos primeiros a reconhecer o elevado alcance desse projeto, proporcionando-lhe local e condições para instalação da escola de música.
Os alunos passaram a receber, gratuitamente, aulas de instrumentos de corda (violino, viola, violoncelo e contrabaixo), teoria musical, flauta doce, canto coral, percussão, inglês e informática básica, atendimento médico, odontológico, psicológico e pedagógico, além de três refeições diárias, contando ainda com todo o fardamento e material didático.
Estava realizado o sonho de Cussy de Almeida. Ontem, em Afogados da Ingazeira, esse sonho foi transportado para mentes e corações de uma plateia que assistiu, emocionada, pela primeira vez, os meninos do Coque em praça pública, num cenário lindo: defronte à entrada da suntuosa Catedral em estilo gótico, uma das mais belas do Estado.
A Orquestra Criança Cidadã já se apresentou, em 16 anos, até para o Papa. “Diz o provérbio que querer é poder. Mas não é todo querer que se torna poder. É preciso sonhar, sabendo o que se quer realizar. É caminhar na direção de sua concretização. É vivê-lo intensamente em cada etapa. Removê-lo do coração e passá-lo para a mente que planejará cada um dos seus mínimos detalhes. E depois partilhá-lo com pessoas que tenham o mesmo sonhar e que aceitem tirá-lo do papel. Com a Orquestra Criança Cidadã dos Meninos do Coque a história não foi diferente. Nasceu de um sonho pessoal de Cussy, que assumi”, diz o juiz Targino Gondim.
Mesmo não tocando um só instrumento, ele sempre vislumbrou na música uma via de crescimento interior para quem a pratica. E, acima de tudo, de oportunidade, notadamente para os desafortunados do destino.
“Desde o ano 2000, tenho a honra de integrar o Projeto Criança Cidadã, idealizado e posto em prática pelo Desembargador Nildo Nery, atualmente Presidente da ABCC – Associação Beneficente Criança Cidadã, artífice da solidariedade, magistrado de notável saber jurídico e imensa bondade no coração. Ele de imediato se ofereceu para albergar o projeto na Associação que preside, sendo a sua colaboração pessoal decisiva para a alavancagem e sucesso da iniciativa”, afirmou.
“Tenho plena convicção de que a criação de oportunidades para os jovens carentes — não as consignadas na esmola, que tanto humilham, massacram e amesquinham o ser-humano —, mas aquelas que propiciam sua formação profissional, seja pelas artes ou pelos esportes, se constitui em via de acesso à cidadania. Destarte, ao assim agir, sinto-me responsável socialmente e ao mesmo tempo cumpridor no plano legisferante dos sacrossantos princípios da dignidade da pessoa humana e da proteção integral da criança e do adolescente, ambos preconizados na Carta Magna de 1988”, acrescentou.
A Orquestra Criança Cidadã foi um presente para o público de Afogados da Ingazeira dado pelo casal de empresários Joseph Domingos e Maria do Carmo em comemoração aos 40 anos de fundação do laboratório Diagnósticos Maria do Carmo. O cerimonial do fantástico evento de ontem foi conduzido pela competente Tatiana Marques, de quem, aliás, saiu a ideia de levar os meninos e meninas do Coque a integrar o roteiro de festividades dos 40 anos do laboratório.