A insanidade na escolha da localização da ESA em Pernambuco
Por Heitor Scalambrini Costa*
O negacionismo ambiental propagado pelo ex-capitão de extrema direita, que chegou à presidência da República pelo voto popular, fez escola dentro do Exército brasileiro.
A manipulação das informações é tanta que a proposta de construção da Escola de Sargentos e Armas (ESA), estabelecimento de Ensino de Nível Superior (tecnólogo) do Exército brasileiro em Pernambuco, entre os municípios de Abreu e Lima, Araçoiaba e Camaragibe; é vista pelos exterminadores do futuro como algo de positivo para o Estado. O próprio ex-comandante da 7ª Região Militar na audiência pública realizada em fevereiro de 2022, onde se discutiu este megaempreendimento, chegou a afirmar “o empreendimento será desenvolvido com uso racional do espaço e oferecerá mínimo impacto ambiental. A atuação do Exército favorece a preservação da natureza, pois, além de fazer o manejo adequado dos territórios que ocupa, a instituição fiscaliza, inibe a invasão e impede o desmatamento”.
Para algum desavisado, o discurso do general estaria corretíssimo, e seríamos os primeiros a “bater palmas”. Todavia, a localização desta construção é uma grande ameaça a uma das áreas mais ricas em biodiversidade do planeta, a Mata Atlântica; cujos resquícios em Pernambuco, apontam para irrisórios 6% da floresta original. É o ecossistema onde 70% da população brasileira vive em território antes coberto por ele. Hoje, restando apenas 12,4% da floresta que existia originalmente no país, e cuja fauna tem grande variedade de espécies de aves, mamíferos, répteis, anfíbios e insetos, sendo que boa parte endêmica.
A área prevista para abrigar a ESA, corresponde ao desmatamento de 2 milhões de m2 de floresta (equivalente a 200 campos de futebol), fica localizada na Unidade de Conservação de Uso Sustentável APA Aldeia-Beberibe, criada pelo decreto estadual no 34.692, de 17 de março de 2010. Em seus 10 considerandos e 5 objetivos, o legislador evidenciou a importância deste território para a qualidade de vida dos habitantes da região metropolitana do Recife, e a necessária proteção ambiental para resguardar a biodiversidade ali existente.
O disparate e a insanidade são de tal magnitude, que caso o desmatamento seja realizado, colocará em risco os recursos hídricos do sistema Botafogo, principal fonte de fornecimento de água que atende os municípios localizados na Zona Norte da Região Metropolitana do Recife (Olinda, Igarassu, Paulista e Abreu e Lima), com uma população estimada em mais de 700.000 pessoas.
Mesmo se tratando de Área de Proteção Ambiental (APA), amparada pelas leis de proteção aos mananciais, pela lei da Mata Atlântica e por outras legislações de proteção ambiental, o que impõe restrições e limites aos empreendimentos que coloquem em risco o ecossistema; ainda assim está construção é defendida, principalmente por razões econômicas com a alegação de que serão investidos 1,8 bilhões de reais (no ano passado era 1 bilhão de reais).
Um clamor a toda sociedade pernambucana, é que nos unamos contra mais esta afronesia promovida por instituições de Estado. Os argumentos injustificáveis para tal empreendimento negam a ciência. Além de autoritários e sem nenhuma fundamentação técnico-científica que justifique este monstruoso desmatamento de uma floresta estabelecida. Aceitar a promessa de replantio da floresta desmatada, em outro local, carece de no mínimo algum sinal de inteligência.
O Fórum Socioambiental de Aldeia, em sua luta quase solitária contra desmandos que se avolumam ao longo dos anos contra o bioma, em defesa da qualidade de vida dos habitantes deste território, merece todo nosso respeito e apoio.
Somos todos Fórum Socioambiental de Aldeia. Somos todos ambientalistas.
* Heitor Scalambrini Costa é físico pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), mestre em Ciências e Tecnologia Nuclear pelo Departamento de Energia Nuclear da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), doutor pela Universidade de Aix-Marselha, Laboratório de Fotoeletricidade/Comissariado de Energia Atômica da França, professor aposentado da UFPE e ativista ambiental.