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O Assum Preto do rádio

Publicado em Notícias por em 11 de setembro de 2021

Anchieta Santos calou o rádio sertanejo. Para mim, que com ele convivi na busca incessante da notícia, era o Assum Preto eternizado na canção de Luiz Gonzaga. No lugar do canto triste do pássaro gonzaguiano, o canto dele trazia a dor em forma de notícias como tribuno de uma gente sofrida, esquecida pela grande mídia. Anchieta era tão Sertão que cheirava a bode.

Em mensagem ao blog, o jornalista Fernando Castilho, colunista do JC, ouvinte de Anchieta nas manhãs de Geraldo Freire, disse que a voz de Anchieta no rádio era a que mais identificava o Sertão. “Era tão forte, tão marcante que mesmo quando ele narrava que as chuvas inundavam as pequenas cidades da região, a gente percebia sua alegria em ver o Nordeste chovido. Era a marca mais forte do jornalismo rural. Tão forte que a gente se emocionava quando ele dizia “Rádio Jornal, Rádio Notícia”, narrou Castilho.

Já ouvi que quem não tem amor próprio, não será capaz de amar ninguém. O amor de Anchieta pelo que fazia era visível, latente paixão. Na defesa da sua gente, ao invés das interrogações, vinha com as soluções, abria janelas. Só não enxergavam os insensíveis de coração duro, que nunca souberam o que é morte e vida Severina, que nunca viram um rosto triste clamar por um copo de água para matar a sede.

O que será do Sertão a partir de agora, sem aquele vozeirão que transmitia tanta emoção? Sou da geração de Anchieta em Afogados da Ingazeira. Antes mesmo de me converter ao jornalismo, era seu ouvinte, já ouvia sua voz estridente em comícios que animava. Na semana passada, quando fui informado que Anchieta havia sido transferido do Hospital da Restauração, no Recife, para o Emília Câmara, em Afogados, desconfiei que Deus havia feito o chamamento dele para a morada eterna.

Vai-se o nosso Assum Preto, fica impregnado em todos nós um dos seus ensinamentos: fazer rádio é um eterno vício para quem verdadeiramente nasceu radialista. No céu, Anchieta vai adentrar com a certeza de que, aqui na terra, exerceu o seu ofício de bom grado ao Senhor.  Teve o dom de transformar guerra em paz, paz em guerra. Conduziu pensamentos, interpretou ações na fina alquimia de transformar teoria em prática, idiomas em horizontal entendimento.

Poeta dos bons, Ademar Rafael, amigo comum de Anchieta, fez um versinho que sintetiza a dor que estamos sofrendo:

“Para amigos, uma pluma

Para corruptos, cascudo.

Para pobres e excluídos

Foi a voz, foi o escudo.

Os seus exemplos são tantos

Morreu ANCHIETA SANTOS

O meu rádio fica mudo”.

Viva Anchieta Santos!

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