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Os invisíveis da advocacia pernambucana

Publicado em Notícias por em 26 de outubro de 2015

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Por Jefferson Calaça*

A porta do elevador abre, a xícara de café é servida, o papel é entregue e, ao passar pelo corredor, percebe-se um movimento intenso, afobado, irritado. Mas quem passa apenas olha, não consegue ver realmente o que acontece. Ignora tudo o que não lhe diz respeito, o que não tem impacto direto na sua vida. O título deste artigo tem como inspiração a pesquisa feita por um brasileiro impossível de ser ignorado: Josué de Castro, o homem que primeiro viu e denunciou a existência dos trabalhadores invisíveis.

O termo costuma ser aplicado aos profissionais que, apesar de exercerem funções fundamentais para a sociedade, não são vistos por boa parte da população, entenda-se, das pessoas com maior poder aquisitivo ou que se julgam superiores. Mas, o que esse tema tem a ver com a advocacia pernambucana?

No meu ponto de vista, tudo. Há muito, a profissão perdeu o glamour, as condições de trabalho dignas, pois vivemos um tempo de precarização da nossa profissão, com situações impraticáveis para os advogados e com um silêncio inaceitável pela direção da ordem estadual.

Na capital pernambucana, advogados recebem entre 1 mil e 1.500 reais para trabalhar com exclusividade de oito a dez horas por dia, sem qualquer direito trabalhista e assim, passaram despercebidos pelo comando da OAB-PE nos últimos nove anos. Não são notados, tornam-se invisíveis aos olhos daqueles que só possuem olhos para uma pequena elite, por um grupo que domina e determina os rumos da entidade estadual.

No interior, a situação é mais alarmante ainda. Desde o dia 04 de dezembro de 2014, venho caminhando pelas cidades pernambucanas. Visitei cerca de 70. Conheci de perto a realidade dos advogados militantes de cidades jamais visitadas pela diretoria da ordem pernambucana. Viajei pelo agreste, litoral, zona da mata e sertão do Estado. Conheci a realidade dos colegas, que penam diariamente para serem vistos, atendidos e entendidos. Faltam juízes, faltam alvarás, falta representação de um Conselho Estadual aos advogados que labutam diariamente na nossa profissão.

Os processos não andam, os casos se acumulam, a espera é exaustiva. Mas nada é pior do que a sensação de ser invisível. Pode-se até procurar outro sinônimo, porém, nada vai amenizar a sensação de ser oculto, sonegado, desconhecido entre os que deveriam estar ao seu lado, lutando, defendendo os seus direitos e exigindo melhores condições de trabalho para uma classe que vem sofrendo muitas dificuldades para exercer o seu mister.

A realidade tem que ser encarada, enfrentada de mãos dadas, braços unidos, conjugada na terceira pessoa do plural. A defesa das prerrogativas é uma tarefa de todos nós, que sonhamos com uma Ordem que olhe por todos, que veja e escute além dos interesses de poucos, pouquíssimos. Precisamos acabar com o amadorismo na defesa da classe. É urgente a profissionalização desta importante comissão das prerrogativas para que nos respeitem enquanto uma profissão digna e altiva.

Quando Josué de Castro denunciou, em 1993, que eram os braços de crianças e adolescentes, mal nutridos e analfabetos, que moviam os engenhos de cana-de-açúcar do Nordeste, o problema foi visto e combatido pela primeira vez. O exemplo precisa ser seguido. Somos defensores do Estado de Direito, somos defensores da democracia, podemos até ser invisíveis para alguns, mas juntos somos imbatíveis. É hora de mudar e dar vez e voz aos que estão no silêncio e esquecidos pelos donos do poder na OAB-PE.

* Jefferson Calaça é Candidato à presidente da Ordem dos Advogados de Pernambuco (OAB-PE)

 

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