Judiciário teme uso eleitoral por Bolsonaro do desfile militar do 7 de Setembro
Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) temem que o presidente Jair Bolsonaro (PL) use o desfile militar do 7 de Setembro para inflar apoiadores contra o Judiciário e o sistema eleitoral brasileiro. A reportagem é de Cézar Feitoza/Folha de S. Paulo.
O receio é que Bolsonaro reedite a retórica golpista que marcou o último 7 de Setembro, mas com dois agravantes que agora podem aumentar a radicalização: a proximidade das eleições e a data comemorativa do Bicentenário da Independência, para quando é esperada uma parada militar de grandes proporções na Esplanada dos Ministérios.
Para evitar riscos de invasão aos tribunais, os presidentes do STF e do TSE, ministros Luiz Fux e Edson Fachin, têm discutido internamente quais serão os esquemas de segurança. Há, no entanto, divergências sobre como agir para conter eventuais ataques aos tribunais.
A reportagem conversou com ministros, interlocutores dos presidentes dos tribunais, auxiliares de Bolsonaro, militares e integrantes das áreas de segurança nas últimas duas semanas.
A avaliação é que o atual clima entre o Planalto e o Judiciário não está tão hostil como no ano passado. À época, Bolsonaro participou de diversas manifestações com teor golpista antes do 7 de Setembro. No dia da Independência, ele proferiu ameaças contra o STF e exortou desobediência a decisões da Justiça.
Dois dias depois, no entanto, ele recuou. O presidente divulgou uma nota na qual disse que não teve “nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes” e atribuiu palavras “contundentes” anteriores ao “calor do momento”.
Apesar do diagnóstico de que o clima está menos tenso neste ano, existe o receio de que a crise possa subir de temperatura nas próximas semanas, na medida em que o pleito se aproxima e diante da persistente estratégia de Bolsonaro de tentar desacreditar o sistema eleitoral.
Diante disso, integrantes do Supremo e de forças de segurança do Distrito Federal –responsáveis pela proteção do patrimônio na Esplanada– estão monitorando uma série de eventos com potencial de estressar a relação entre os Poderes.
O primeiro deles é a convocação de movimentos bolsonaristas para manifestações em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, em 31 de julho. Apoiadores do presidente tentam organizar o evento como uma espécie de preparativo para o 7 de Setembro.
“Vamos repetir o 7 de Setembro, agora ainda maior. Contamos com vocês para que esse dia (31 de julho) seja um prenúncio de uma eleição limpa no ano mais importante das nossas vidas”, disse a deputada Carla Zambelli (PL-SP), em vídeo.
A área de inteligência das equipes de segurança do DF tem monitorado as mobilizações, e a adesão ainda é considerada baixa.
Outras datas que preocupam são: a posse de Alexandre de Moraes na presidência do TSE (16 de agosto), o Dia do Soldado (25 de agosto) e a posse da ministra Rosa Weber na presidência do STF (12 de setembro).
Apesar dos diferentes eventos, o desfile militar do 7 de Setembro é o que gera maior preocupação na cúpula do Judiciário e entre agentes de segurança. As Forças Armadas preparam uma grande solenidade na Esplanada para este ano, em comemoração aos 200 anos da Independência.
A atual edição também marca a volta da tradicional parada militar após dois anos de suspensão por conta da pandemia da Covid.
O Comando Militar do Planalto enviou ofícios no fim de junho para saber quantas pessoas vão desfilar. Os documentos foram encaminhados a órgãos que participam do evento, como PF (Polícia Federal), PRF (Polícia Rodoviária Federal), PM-DF (Polícia Militar do Distrito Federal) e CBMDF (Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal), entre outros.
O Comando Militar disse, em nota, que ainda não definiu os detalhes do desfile.
Em entrevistas, Bolsonaro tem afirmado que os atos de comemoração do Bicentenário da Independência vão mostrar que ele é o único candidato à Presidência que tem grande apoio popular.
“Eles querem aproveitar a data de 7 de Setembro para ter uma grande concentração, por exemplo, em São Paulo e nas capitais, aqui em Brasília. Vai ser um 7 de Setembro e também um apoio a um possível candidato que esteja disputando”, disse ao SBT News, em junho.
Com discurso semelhante, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) disse à CNN Brasil que o 7 de Setembro terá grande participação popular.
“O político tem que brigar pela preferência do povo. Não é um membro do Judiciário que tem que brigar por isso. Mas as próprias pessoas estão se vendo motivadas a irem para a rua no 7 de Setembro este ano, exatamente para somar a esse grito de socorro que o presidente Bolsonaro está dando para a população.”
Para evitar possíveis tentativas de invasão ao STF, Luiz Fux tem discutido com ministros e a equipe de segurança da corte quais medidas devem ser adotadas para o início de setembro.
No ano passado, o Supremo criou três cordões de isolamento no raio de até três quilômetros, com auxílio da Secretaria de Segurança Pública do DF e da PF. A área mais próxima ao STF foi isolada por grades.
O STF avalia reeditar o esquema de 2021. A sugestão discutida atualmente é ampliar a duração dos cordões de isolamento do Supremo para dois dias antes e dois dias depois do 7 de Setembro.
Fux também tem debatido com ministros a possibilidade de decretar GLO (Garantia da Lei e da Ordem). Dessa forma, as Forças Armadas seriam convocadas para atuar na defesa do prédio do STF, se necessário.
As avaliações no Supremo, no entanto, são divergentes. Há ministros que defendem que as equipes de segurança da corte e a Polícia Militar do DF são suficientes para proteger o tribunal.
Segundo interlocutores, Fux também foi aconselhado a não decretar GLO porque, diante de uma retórica golpista por parte de Bolsonaro, não seria inteligente deixar a segurança do Supremo sob responsabilidade dos militares.
O STF disse, em nota, que tem discutido com o TSE um esquema de segurança conjunto para garantir a proteção dos tribunais e ministros.
“No contexto das eleições, assim como nas demais ações em que os ministros estejam envolvidos, há um canal livre de comunicação entre as áreas especializadas de STF e TSE, com a finalidade de garantir o pleno exercício das atribuições dos magistrados”, destacou.
A Secretaria de Segurança Pública do DF disse à reportagem que o plano e os protocolos de segurança estão em “fase de elaboração”. “O planejamento será constituído com a participação das forças de segurança, bem como de órgãos, instituições e agências locais e nacionais envolvidas”, afirmou em nota.